25 agosto 2016

[Porque uma vez mais, e sempre, é preciso falar com palavras alheias, ler a si pelos olhos - estranhos, desconhecidos - do outro:
***
Fala-se de amor para falar de muitas
coisas que entretanto nos sucedem.
Para falar do tempo, para falar do mundo
usamos o vocabulário preciso
que nos dá o amor.
Eu amo-te. Quer dizer: eu conheço melhor
as estradas que servem o meu território.
Quer dizer: eu estou mais acordado,
não me enredo nas silvas, não me enredo,
não me prendo nos cardos, não me prendo.
Quer também dizer: amar-te-ei
cada dia mais, estarei cada dia
mais acordado. Porque este amor não pára.
E para falar da morte; da enorme
definitiva irremediável morte,
do carro tombado na valeta
sacudindo uma última vez (fragilidade)
as rodas acendedoras de caminhos
- eu lembraria que o amor nos dá
uma forma difícil de coragem,
uma difícil, inteira possessão
de nós próprios, quando aveludada
a morte surge e nos reclama.
Porque eu amo-te, quer dizer, eu estou atento
às coisas regulares e irregulares do mundo.
Ou também: eu envio o amor
sob a forma de muitos olhos e ouvidos
a explorar, a conhecer o mundo.
Porque eu amo-te, isto é, eu dou cabo
da escuridão do mundo.
Porque tudo se escreve com a tua letra.
- FERNANDO ASSIS PACHECO
in 'Cuidar dos Vivos', Coimbra, Edição do Autor/Cancioneiro Vértice, 1963

Gustavo Silveiro

Manuel Bandeira tem uma crônica que começa com um formidável 

"Uf! Acabei de posar para Celso Antônio". 
Quando o bicho pega, fico querendo começar todos os textos com Uf! Acabei de posar para Celso Antônio. Inclusive os acadêmicos. Acho que vou começar minhas aulas também assim. Pelo menos com o Uf, que pode ser bastante útil em sala. Começar é quase sempre estranho e bom, e estranho. Às vezes acontece de um começo acontecer sem que se saiba que algo realmente começou ou está começando, como a amizade, que pode terminar abruptamente mas no geral começa de modo não muito claro. Terminar pode ser mais difícil que começar mas um bom começo (de texto) exige mais brio, ou um mau-humor bem mau como sugeria o Czeslaw Milosz. Claro, um texto começa em qualquer ponto, os meus começam geralmente no segundo ou terceiro parágrafo e vão crescendo para trás (para cima?) até atingirem o começo (o topo?) e simultaneamente vão se derramando, caindo, rolando ladeira abaixo também, até tudo terminar (no chão? no buraco? no nada?). Às vezes está todo pronto, mas a primeira palavra ainda não veio. Uf! Acabei de posar para Celso Antônio.


(preciso dedicar este post a Noemi Jaffe que escreveu um delicioso 'Livro dos começos')


Laura Erber

24 agosto 2016

SEGUNDA TERRA

"No século 16, enquanto a nata da intelectualidade se dividia entre o modelo heliocêntrico e o geocêntrico, Giordano Bruno estava muito além, ao afirmar que o universo não tinha centro, que o centro estava em toda parte e portanto em nenhuma. Perfurando a abóboda de dogmas e limitações, o napolitano ainda sustentava que cada estrela era outro Sol, cada uma com seu sistema de planetas, infinitos mundos e infinitas civilizações. Hoje foi anunciada a descoberta de um planeta similar à Terra, com potencial significativo de vida, a meros 4 anos-luz (uma sonda ou nave viajando à metade da velocidade da luz chegaria lá em 8 anos). Na escala astronômica, isto significa dizer que, se o universo fosse o globo terrestre, teríamos achado um irmão no quarto do lado. Pascal se apavorava com o silêncio infinito das escuridões siderais, mas hoje ficamos sabendo que as distâncias não eram tão assombrosas, que os silêncios não são tão solitários, que hemos de conhecer outros mundos. O infinito é maravilha de Giordano, vindicado mais uma vez."

Bruno Cava

Por Sabrina Aquino

"Nasci e morei um bom tempo da minha vida em cidade do interior de MG, e vou falar pra vocês sobre uma coisa que sempre me fez odiar com todas as forças viver nesse lugar. Existe um comportamento muito comum na sociedade capitalista que é a necessidade de parecer "winner", pois, é vendido que na vida só existem dois tipos de gente: winners ou losers (dentro do padrão pré estabelecido do que são as características de cada qual). E ninguém quer ser loser, obviamente. Acontece que, como é cidade interiorana, provinciana e até meio afastada da realidade de cidades muito maiores e mais diversas, a mania de competir e demonstrar sucesso é latente, porque vc tem um grupo espectador mais comprometido e dependente das atualizações e nem precisa vigiar o facebook alheio, pois isso se percebe no dia a dia, pela roupa que alguém anda, com o carro novo que a pessoa aparece na igreja aos domingos e no simples fato de comentar com alguém cercano, que de boa fé, comenta a outro e assim se espalha porque a cidade é pequena mesmo: "viu, fulano comprou apartamento", "sabe onde a cicrana e o beltrano foram viajar de férias?". "Joãozinho trocou de carro". E vivendo aí nesse contexto vc acaba se sentindo cobrada e sendo obrigada a responder esses estímulos de competição de "não ser uma loser", e muitas vezes, sem se dar conta. Pois bem, um dia me dei conta e passei a cagar.
Houve um tempo que me afetou muito essa cobrança e essa competição de 'quem tá mais bacana na vida', inclusive entre amigos TODOS FODIDOS pagando prestações e mais prestações, eu ali toda danada, trabalhando e estudando, me virando nos trinta todo dia, mas rodeada de gente que andava no salto alto, sem dar pinta de loser (e eu me sentindo lixão pq não dava conta de acompanhar, nem que eu me virasse em duas). Até que um dia deixei de ligar e virei a pessoa mais feliz do mundo por hoje nem lembrar como é viver pendente dessas bobagi. Hoje rio da vontade, da necessidade dessa gente ser V.I.P. ou se sentir "winner" na JEQUICE, numa cidade cafona (sim cafona, com privação de beleza estética, com muita dificuldade de transporte urbano coletivo, na sua ditadura do carro, na sua demarcação elitista de espaços urbanos usando parâmetros da jequice competitiva, usando padrões incompatíveis pra tal contexto, na feiura propriamente dita), e com sentimento pequeno burguês da roça."

Eu não consigo parar de falar do Isaquias. Por isso, vou falar do Edvaldo.

Edvaldo é o dono desta casa aí em cima, ornada com bandeira do Brasil em tempos olímpicos. A casa do Edvaldo fica em Belford Roxo, cidade da Baixada Fluminense, apontada em um ranking feito ano passado com medalha de prata na categoria piores cidades para se viver no Brasil. Edvaldo mora em Xangri-lá, um dos piores bairros de Belford Roxo.
Acontece que Edvaldo não é de lá, é de Ubaitaba, a "terra das canoas", onde nasceu Isaquias Queiroz, o maior medalhista brasileiro em uma só Olimpíada desde o último sábado. Lá, sul da Bahia, viraram amigos, remaram juntos, passaram coisas boas e ruins ao mesmo tempo, sonharam ao mesmo tempo brilhar na canoagem, viveram a realidade dura do esporte olímpico brasileiro. Mais velho, Edvaldo viu Isaquias surgir enquanto já se destacava. Foi até vice campeão sul-americano, em 2008, era atleta do programa Bosla Atleta. Daí o clichê "menino do interior do Nordeste que vem tentar vencer no Rio de Janeiro" se aplica aos dois, Edvaldo e Isaquias, de maneira completamente diferente.
A vida fez o remo de Edvaldo ficar pesado demais. Bolsa Atleta não deu conta de sustentar a família, ele veio para o Rio, esposa e filhos a tiracolo, tentar remar em outro canto, remar com CLT, de preferência. A tal da estabilidade, coisa que não existe, acho eu, dentro de canoa alguma. Virou motorista de ônibus de linha urbana, pipocando de viação em viação em um mercado explorador, insalubre que até eu, que nunca dirigi um ônibus nem remei numa canoa, consigo visualizar o nível de quebra de qualidade de vida do rapaz. Era preciso. E ele foi. Fazer o quê. Enquanto isso Isaquias se destacava cada dia mais na canoagem, já em nível mundial.
Há quatro anos Edvaldo não via Isaquias. Até a última terça, dia em que o Isaquias ganhou sua primeira medalha, de prata, no C1 1000m. Em fase de testes em uma empresa que faz o trajeto de Nova Iguaçu, outra cidade da Baixada, até a Central do Brasil, no Rio, com medo de perder o emprego, nem cogitou a ideia de pedir dispensa ou troca de horário para ver o amigo, apesar de uma oferta de ingresso da Confederação. Trabalhando, sofreu um pequenos acidente de trânsito, quando um carro de passeio bateu no ônibus que ele dirigia bem de manhãzinha. Sem culpa no sinistro, foi até a garagem onde conseguiu, no radinho, escutar a prova que deu a medalha ao amigo. Se emocionou e, não tendo mais que trabalhar no dia, correu para a Lagoa onde, em meio aos populares, na saída do Estádio, conseguiu reencontrar e dar um abraço no amigo medalhado.
No sábado, mais uma vez, Edvaldo não conseguiu ir à Lagoa. Tinha que beter o cartão três horas depois da prova que deu a terceira medalha a Isaquias. E aí fomos com uma equipe de reportagem para lá. Foi a história que mais gostei de contar nessas Olimpíadas pela Band. O Vinicius Nicoletti acompanhou com o Edvaldo pela TV, em Belfrot Roxo, e eu fui pra Lagoa, ver o Isaquias de perto. Edvaldo viu a prova de joelhos. Chorou, de orgulho. Não há um pingo de remorso, arrependimento nas palavras de Edvaldo. Há um tremendo de um orgulho do amigo, e de ter treinado com o maior medalhista do Brasil na Rio 2016. Edvaldo é a representação do espírito olímpico.
Na Lagoa, no meio de toda a imprensa brasileira querendo falar com Isaquias, enfiei o meu celular para o canoísta: "É o Edvaldo. De Ubaitaba. Ele quer te dar o parabéns". E o Isaquias pegou o telefone, deu um passinho pra trás, dedinho no outro ouvido, e ficou por uns sete minutos só agradecendo os parabéns que recebia do amigo conterrâneo, e relembrando dificuldades que passaram.
- Mas como é que você tá se sentindo, Isaquias? - perguntou Edvaldo.
- Rapaz... - ponderou o medalhista ao telefone, prata no peito, com aquela introdução gostosa de sotaque baiano - por enquanto, eu tô me sentindo só o Isaquias mesmo.
E amanhã, rapaz, o ônibus do Edvaldo sai cedinho de Nova Aurora, bairro de Nova Iguaçu, chegando uma horinha depois na Central do Brasil, no primeiro dia sem esse evento que vivemos, com milhares de outros Edvaldos, alguns Isaquias, buscando seu caminho nessa vivência entre sonho e realidade que vivemos.
E eu não sei mais o que falar sobre o que foi tudo isso que passou. Um dia a gente entende. Quem sabe." - Thales Machado

23 agosto 2016

O rabo e a boca

"A conquista crítica da liberdade intelectual exige uma cirurgia traumática: aquela que secciona o longo nervo que liga o rabo à boca. De rabo preso, ninguém pensa verdadeiramente. E quem não vive como pensa, acaba pensando como vive. Na era do contágio emocional e do adesismo facilitado por "compartilhamentos" e "seguidores", são cada vez mais escassos os independentes, os não alinhados e nem alinháveis (penso aqui em um Albert Camus, por exemplo). Mas quem tiver algum resíduo de sensibilidade histórica, logo concluirá que o mundo transformou-se bem mais pelo uivo de dois ou três lobos solitários do que pela afinação do coral de centenas de meninos amestrados. E enquanto seu lobo não vem, fiquemos com essa marmota com rabo na boca, um manjar da tradição lusitana que se perdeu das nossas mesas coloniais."
Marcus Fabiano 


"O ensaio, diz-nos João Barrento, é ser-mulher, escreve-se no feminino:
segredo, acolhimento, transgressão: são outros nomes para o amor, creio - um amor não-narcísico, do outro e ao outro, incondicionalmente. O eu que se projeta (e ama) só existe, no texto, no corpo do ensaio, nos seus objetos e em função deles."

via: Gustavo Silveira 

22 agosto 2016

Hoje eu perdi o meu melhor amigo. A morte, essa pantera, levou Geneton Moraes Neto. Tínhamos 16 anos quando nos conhecemos; exatamente a mesma idade, com uma diferença de semanas entre os nossos aniversários. Para mim, que sou filho único, Geneton foi aquele que me fez entender o que poderia ser um irmão. Fizemos dois filmes juntos: o super-8 "Esses onze aí", sobre nossa paixão comum pelo futebol, e o 16 milímetros "O coração do cinema", sobre a nossa também comum paixão pela poesia de Vladimir Maiakovski. Quem já fez cinema - mesmo amadoristicamente, como era o nosso caso e como sempre preferimos - sabe o que significa co-dirigir: é preciso que exista uma enorme sinergia, compreensão mútua. Creio que era o que existia entre nós. Nunca divergimos sobre a escolha feita por um ou por outro. Como foi possível? O fato é que gostávamos de coisas parecidas: de escutar "The long and winding road" dos Beatles, de ver a beleza de Charlotte Rampling nos filmes, de ler e reler o romance Quarup, de Antônio Calado, de considerar que a genialidade dos dribles de Pelé superava qualquer bobagem política que ele pudesse dizer. Somos... éramos (como é terrível usar o verbo no passado...) criaturas dos anos 1970. A certa altura, consideramo-nos anarquistas. Eu, sempre mais livresco do que ele, comprando na Livro 7 livros de Bakunin; Geneton, sempre mais intuitivo do que eu, simplesmente entendendo que a opressão não é exclusiva a nenhuma ideologia. Geneton foi primeiro para a França, estudar cinema na Sorbonne. Depois me explicou como me inscrever no mesmo curso. Ele largou a formação, porque não suportava os excessos da teoria; eu, mais tolerante com os conceitos, fui até o fim do doutorado. Trabalhamos juntos como jornalistas duas vezes: na sucursal do Recife de O Estado de S. Paulo (ele me indicou a Carlos Garcia) e na TV Globo (creio que eu o indiquei a Roberto Menezes). Casamos mais ou menos na mesma época e tivemos ambos três filhos (que, agora me dou conta, infelizmente não se conheceram). Ultimamente, não nos víamos tanto, ocupados em tocar nossas vidas e em sobreviver, apesar da mediocridade e da vulgaridade vigentes. Há poucos meses, estivemos com ele - eu, Jomard Muniz de Britto e Amin Stepple - debatendo seu último filme, "Cordilheiras no mar: a fúria do fogo bárbaro." Mesmo morando em cidades distantes, ele me telefonava para dar notícias, sempre começando com um recorrente: "Oi, tudo certo?" E tudo sempre estava certo, é claro. Tudo estava sempre azul. Talvez seja mero saudosismo, talvez ingenuidade, mas hoje eu queria estar de volta a 1973, para reencontrar meu amigo como se fora a primeira vez, pegar uma câmera super-8, chamar Amin, Wilson, Camilo e Nara, Jomard, Aninha e Juliana - e dizer: "Cinema é muito chato; legal é filmar." Pouca gente entenderia hoje essa frase (até porque poucos amaram tanto o cinema como nós) e é por isso que me sinto tão sozinho hoje.

Paula Cunha

Sobre Anjos Eventuais

"Se você está andando numa rua sozinha e, do nada, uma pessoa aparece pra te fazer companhia, ela não é um anjo, é uma pessoa normal mas, naquele instante, é um anjo eventual. Nós podemos ser anjos eventuais também e, provavelmente, já fomos algumas ou muitas vezes.
Uma vez eu estava muito aperreada, e nessa época minha válvula de escape era andar sozinha, mesmo que fosse em plena Avenida Canal, quando de repente apareceu uma moça que me perguntou onde era uma determinada rua, o que é claro que eu não sabia. Quando ela viu que eu estava chorando (não por não saber onde era a rua, claro, eu estava mesmo mal) me acompanhou até o ponto mais próximo de táxi e só saiu quando eu entrei no carro. Só por ter conversado comigo naquela hora ela já teve seu momento de anjo eventual.

Outra vez, em um domingo de manhã, quem teve esse papel foi Odimar Bomfim, que do nada ligou pra mim e leu um poema de Flora Figueiredo, me salvando em outro momento de tristeza.

Mas é claro que você pode duvidar dos anjos, inclusive dos eventuais, e colocar tudo no pacote das coincidências. Ou de uma espécie de transmissão de pensamento. Aconteceria outras vezes comigo, mas feitas com muito esforço - quem já tentou sabe que é muito difícil fazer este elo. Um vez eu queria muito que um futuro-namorado-depois-futuro-ex ligasse pra mim. Estava apaixonada e precisava ouvir sua voz. Ele telefonava às vezes, estudávamos juntos e de vez em quando combinávamos alguma coisa, como trabalhos em grupo. Só que já era mais de meia-noite, o que fazia com que tanto esforço fosse quase em vão. E não existia celular.
Só que ele ligou. Não era apaixonado por mim, nem nada. Havia música alta e foi preciso falar bem alto pra eu escutar:

- Estou aqui numa festa, não sei porque resolvi ligar pra você."

Alana Agra

Ao ver a abertura dos Jogos Olímpicos, pensei na grade dourada de Versalhes

Jorge Coli
Ao assistir pela televisão à abertura dos Jogos Olímpicos, pensei na grade dourada do palácio de Versalhes.

Essa grade foi instalada por volta de 1680, sob Luís 14, e retirada em 1771, sob Luís 15. Em 1838, o rei Luís Felipe erige, no lugar em que ela se situava, uma estátua de Luís 14 a cavalo.
Em torno dela, grande embrulhada de Luíses. Mas o importante é que existiu e desapareceu.
Em 2008, o arquiteto responsável pelo palácio decide refazer a grade. A documentação visual que se tem é por vezes contraditória. Não importa. Esse arquiteto, Frédéric Didier, tira a estátua equestre e reinventa a grade.
O motivo é "voltar ao estado de origem". A expressão, pela sua simplicidade e por sua evidência de verdade, seduz o público desprevenido. Ele pensa: vamos ter o prédio, o objeto, seja lá o que for, "exatamente como era". Infelizmente para os desprevenidos, no campo da cultura, nada é claro, simples ou transparente. E nada é como era.
O palácio de Versalhes foi, em sua origem, um pavilhão de caça que o rei Luís 13 fez construir. Seu filho, Luís 14, transformou-o na mais suntuosa das moradias. Os trabalhos nunca cessaram ali ao longo dos anos e dos reis.
A tal ponto que a grade atual, com pretensões de ser a de 1680, se apoia num pavilhão construído por Luís 18 –em 1820!
Voltar ao estado original: lema sedutor que se põe a serviço de uma poderosa mitologia. Que original? De Luís Felipe, de Luís 18, de Luís 15, de Luís 14, de Luís 13? Ou voltar à charneca de origem, antes que nada fosse construído ali?
("Voltar ao original", refazer "tal como era", é um motivo teórico. Na França, vem acompanhado por outro mais mesquinho. Deixo a palavra com o historiador Adrien Goetz: "Quando encontram um mecenas, os arquitetos chefes, que levam 10% de cada canteiro de obras, propõem reconstruções mirabolantes, como essa monstruosa grade dourada".)
Os edifícios –e todas as obras de arte– não cessam de se transformar. A autenticidade filológica que fixa é um instrumento da cultura, e não uma verdade fora do tempo. A filologia leva ao crime, escreveu Ionesco.
Em suma, a grade de Versalhes é uma engambelação, embora muita gente acredite nela. Creio que ela me veio à mente quando eu assistia à abertura dos Jogos por causa das crenças coletivas e do ouro-besouro que existem em ambas.
Não é adequado esperar invenções e profundidades num espetáculo do gênero. Basta algo que encha os olhos e crie euforia. A abertura atingiu seus objetivos, com índios manejando cipós luminosos e fogos de artifício.
Reafirmou também os mitos que a cultura nacional criou para o Brasil: mito das origens, mito da miscigenação (que possa existir miscigenação no Brasil é uma coisa, que se transforme isso num mito e numa crença é outra), mito da unidade, apelo aos sentimentalismos fáceis da ecologia (quando, no Brasil, as florestas são devastadas e os índios, dizimados) em modo insuportavelmente meloso com sementinhas, criancinhas e plantinhas.
A figura de uma linda loira foi celebrada como um símbolo quintessencial, enquanto os negros foram postos em seus lugares: samba, funk, projetos sociais. Tudo direitinho, onde devia estar.
A transfiguração da história, a ideia de que há um brasileiro genérico, "o brasileiro", faz-nos esquecer de que esse ser no singular é um construto fictício e só existe porque acreditamos nele. Trata-se de redução do múltiplo a uma unidade geral.
Houve época em que se imaginou esse brasileiro como melancólico, outra como cordial, ou ainda como malandro alegre, barroco, dionisíaco, mestre das gambiarras. São ficções e são crenças moldando comportamentos que buscam a semelhança com o grande modelo.
A abertura da Olimpíada foi hábil. Embasbacou e reiterou mitologias. Afirmou um "ser" que é "nosso". Muito coerente com a convicção de que cada atleta "é" o seu país. Havia ali uma pequena réstia, simpática, com os Atletas Olímpicos Independentes, desfazendo as fronteiras e os desenhos dos territórios.
Jean Renoir termina seu filme "A Grande Ilusão", sobre a Primeira Guerra Mundial, com dois militares franceses fugindo de uma patrulha alemã. De repente, os alemães cessam o fogo. Não havia marca alguma sobre a neve, mas os fugitivos alcançaram o território suíço: a fronteira invisível os separava e protegia. Um dos dois comenta: "Fronteiras são invenções dos homens. A natureza não se importa com isso". Lembro a frase admirável de Lobato em um livro infantil: "A humanidade forma um corpo só".

20 agosto 2016

"O conformismo, que sempre esteve em seu elemento na social-democracia, não condiciona apenas suas táticas políticas, mas também suas idéias econômicas. E uma das causas do seu colapso posterior. Nada foi mais corruptor para a classe operária alemã que a opinião de que ela nadava com a corrente. O desenvolvimento técnico era visto como o declive da corrente, na qual ela supunha estar nadando. Daí só havia um passo para crer que o trabalho industrial, que aparecia sob os traços do progresso técnico, representava uma grande conquista política. A antiga moral protestante do trabalho, secularizada, festejava uma ressurreição na classe trabalhadora alemã. O Programa de Gotha já continha elementos dessa confusão. Nele, o trabalho é definido como "a fonte de toda riqueza e de toda civilização". Pressentindo o pior, Marx replicou que o homem que não possui outra propriedade que a sua força de trabalho está condenado a ser "o escravo de outros homens, que se tornaram... proprietários". Apesar disso, a confusão continuou a propagar-se,
e pouco depois Josef Dietzgen anunciava: "O trabalho é o Redentor dos tempos modernos... No aperfeiçoamento... do trabalho reside a riqueza, que agora pode realizar o que não foi realizado por nenhum salvador". Esse conceito de trabalho, típico do marxismo vulgar, não examina a questão de como seus produtos podem beneficiar trabalhadores que deles não dispõem. Seu interesse se dirige apenas aos progressos na
dominação da natureza, e não aos retrocessos na organização da sociedade. Já estão visíveis, nessa concepção, os traços tecnocráticos que mais tarde vão aflorar no fascismo. Entre eles, figura uma concepção da natureza que contrasta sinistramente com as utopias socialistas anteriores a março de 1848. O trabalho, como agora compreendido, visa uma exploração da natureza, comparada, com ingênua complacência, à exploração do proletariado. Ao lado dessa concepção positivista, as fantasias de um Fourier, tão ridicularizadas, revelam-se surpreendentemente razoáveis. Segundo Fourier, o trabalho social bem organizado teria entre seus efeitos que quatro luas iluminariam a noite, que o gelo se retiraria dos pólos, que a água marinha deixaria de ser salgada e que os animais predatórios entrariam a serviço do homem. Essas fantasias ilustram um tipo de trabalho que, longe de explorar a natureza, libera as criações que dormem, como virtualidades, em seu ventre. Ao conceito corrompido de trabalho corresponde o conceito complementar de uma natureza, que segundo Dietzgen, 'está ali, grátis'."

(Walter Benjamin, 11a Tese)
A solidão, para Ana, era imensa. Tudo aquilo que ela via, tudo o que ela sentia era a ruptura que a separava do que ela via e sentia. As nuvens fúnebres, mesmo que cobrissem o jardim, entretanto, permaneciam invisíveis na nuvem que as envolvia. A árvore, desenhada a alguns passos, era a árvore em relação a qual ela estava ausente e totalmente distinta. Em todas as almas que a circundavam como tantas claridades, e que ela podia tão intimamente aproximar de sua própria alma, havia, única claridade que as permitiu perceber, uma consciência silenciosa, fechada e desolada, e é a solidão que criava ao redor dela o doce campo das relações humanas nas quais, entre infinitas relações plenas de harmonia e de ternura, ela via vir a seu encontro sua dor mortal.

De "Thomas l'obscur"... - Maurice Blanchot

Via: página de notas do Vinicius Honesko

17 agosto 2016

Sueli Feliziani

"você não encontrou a pessoa certa"
"não pode desistir, um dia a pessoa certa aparece"
"não é porque você sofreu que tem que perder a coragem de tentar"

eu poderia escrever um livro sobre como essas merdas sobre amor fodem a vida de mulheres.
As mulheres são abusadas física, emocional, financeiramente e ainda são cobradas a ter uma eterna esperança no relacionamento eterno com o "homem ideal" - porque heternorma tá aí pra isso- que a faça sair da solteirice e abrace a vida de mulher honesta. E cobradas a nunca desistir dessa tentativa insana de ser feliz com um acessório amor do lado. Não há espaço para a criação de formas de felicidade autônoma. Não há espaço para amores que não sigam essa regra. Não há espaço para qualquer construção afetiva para longe do romantismo.
CARALHOS, PAREM DE FAZER ISSO!
Já vi relacionamentos e casamentos se desfazerem em quantidade suficiente à minha volta para dizer: a fórmula não funciona. Mano, pensem, se 40% das pessoas se divorciam, é porque não dá certo esse trem.
Não existe pessoa certa. Todo mundo é a pessoa certa até não ser mais.
Aquele cara charmoso, bonzinho, e que te enche de atenção é o mesmo abusador do fim do namoro. Aquele cara super forte e protetor que cuida de você é o mesmo que carrega arma ou que põe seus filhos contra você. Aquela moça maravilhosa que vc ama é a mesma que vai te chantagear emocionalmente e fazer gaslitgh pros seus amigos e família.
Pessoas são assim.
Não existem contos de fadas. Exceto aqueles em que há um lobo, na floresta que é o lugar natural dele, e se você ignorar isso e não tomar cuidado com sua saúde emocional quem se fode é você.
Não se estabelece relações saudáveis buscando coisas que não existem. Ou se violentando para tentar encontrar no outro o salvador pro seu romance de folhetim.
Bora crescer e parar de impor que amor é obrigatório.
Bora crescer e parar de impor que amor é imprescindível para felicidade.
Bora crescer e parar de impor que amor precisa ser encontrado.

do contrário, o outro falhou em cumprir sua expectativa de criança de 5 anos de que o salvador iria aparecer e levá-la para o castelo."

15 agosto 2016

"NÓS NÃO AJOELHAMOS - Silvio Pedrosa

Didático, absolutamente didático, o que está acontecendo com o evento por um grande Fora Temer que começou a ser organizado por pessoas independentes: o pós-governismo acusa o ato de "golpismo" porque ele não pressupõe ou deseja a volta de Dilma. A esquerda hegemônica do pós-governismo, como insistimos há tempos, não tem interesse em mobilizações que saiam do controle dos discursos e narrativas forjadas nos comitês centrais partidários que agora são as agências de marketing.
A falácia que insiste no golpe é dupla e se esclarece nessa reação.
Em primeiro lugar, o "golpe" é um topos de aglutinação de forças, uma linha que traça uma divisão a partir de uma moralidade política. Como todo moralismo, ele é hipócrita. Enquanto as cúpulas partidárias jogam o jogo bruto dos acordos e negócios sem nenhuma consideração por essa moralidade, ela é incessantemente (re)produzida como micropolítica, iluminando a dupla natureza da hegemonia petista: enquanto a macropolítica produz um poder pastoral, a micropolítica se investe de todo um rol de culpas interiorizadas e mobilizadas. Omnes et singulatim.
E em segundo lugar, o "golpe" se constrói, enquanto acontecimento significativo, a partir de uma operação de memória e esquecimento: enquanto se mobilizam memórias cinquentenárias, silenciam-se memórias do que se passou a três anos ou, mesmo, três meses (o PLP 257, por exemplo, enviado ao Congresso por Dilma; Belo Monte foi inaugurada por Dilma como espécie de último triunfo da república dos engenheiros). Um trato sério com o que efetivamente é aquilo a que chamamos "democracia" no Brasil não permite que se chame golpe ao que se passou. Não há golpe contra a democracia numa democracia organizada por golpes sucessivos. No cômputo geral do estado de exceção através do qual somos governados (talvez desde 1964, com ritmos e tons variantes), a dramaticidade e a ruptura da deposição de Dilma Rousseff (com todas as chicanas e gambiarras que aconteceram) não se destacam, salvo se você é um daqueles que identificam a democracia na cor da roupa do rei. Os princípios mobilizados para defender a cor da roupa da rainha são os mesmos que a própria, seus conselheiros e burocratas sistematicamente desrespeitaram em nome da governabilidade (a ponto de recorrerem a uma comissão internacional que eles próprios asfixiaram financeiramente quando a mesma, anos antes, os condenou por suas violações e abusos).
Não é Temer que preocupa o PT (Henrique Meirelles era o campeão também de Lula). Assim como não é o PT (isolado e em frangalhos) que preocupa Temer. O perigo que ronda sempre foi outro: a possibilidade de um outro pacto, constituído a partir de forças constituintes que ousaram quebrar o consenso das empreiteiras em 2013 (antes e diretamente relacionada com a Lava-Jato). Foi por esse consenso que Dilma e o PT reprimiram as ruas. Foi por esse consenso que Dilma foi descartada.
O jogo dos tronos é esse. Qualquer um que não se ajoelha perante tais regras, é considerado selvagem, um fora da lei. E foi na confusão entre selvagens e usurpadores que a rainha perdeu o trono. Mas eles não são os mesmos e essa distinção fundamental é o terreno a partir do qual qualquer mobilização real, por direitos e contra as reformas que se avizinham, precisa partir. Contra todos os tronos, só podemos contar com aqueles que não se ajoelham perante ninguém."

07 agosto 2016

Notas sobre o canalha do "bem"

"O canalha "do bem", assim como o suco, nos faz pagar muito mais caro que o canalha barato. Isso porque ele é tão gente boa que você fica até constrangida de reclamar quando descobre que você é só mais uma na ciranda de mulheres que ele faz em torno de si na praça São Salvador. Ele é um canalha cheio de boas intenções, por isso vive refletindo sobre como fazer o que quer com todas as mulheres ao mesmo tempo sem magoar nenhuma delas. Ele acha sempre que é tudo APENAS uma questão de comunicação. Até aceita bem as críticas sobre seu comportamento, mas só uma vez, depois ele te ignora solenemente. O canalha do bem se preocupa muito com a própria imagem de bom moço e detesta escândalos. Se uma mulher demonstra muito sentimento, ele fica tão preocupado que pode até broxar, diferente do canalha genuíno que nunca falha nessas horas. Canalha do bem é canalha sem querer, muito mais nocivo que o canalha convicto. Ele parece sensível, deixa criar esperança de futuro, dá perdido e reaparece nos deixando perdidas. Embora ele não admita, seu jeito de ser é um privilégio masculino. Do lugar de onde eu venho quando a mulher resolve botar a pomba pra girar na roda corre o risco de ser espancada no meio da rua na frente dos vizinhos "porque mereceu". Ou então ser estuprada ou assassinada por vingança. Toda hora a gente vê notícias dessas. Ou seja, uma mulher não tem nem como ter a Ilusão de tá tranquilo. Nunca está. A gente sempre sabe que vai ter um cara que vai se apaixonar e ficar muito bolado com o nosso comportamento. Então criamos um estado de atenção para dar conta desse tipo de situação. Independente de como resolvamos agir (eu não questiono a liberdade das mulheres para isso) estamos mais conscientes do que estamos fazendo. Não podemos nos escorar em uma justificativa tosca como "a poligamia é um instinto e o meu gênero me leva a espalhar a espécie". Temos que lidar com as consequências práticas da fama de vadia que não arranha só a nossa imagem, mas ameaça nosso corpo físico, a possibilidade de relacionamentos futuros e pode causar graves marcas afetivas. Algumas resolvem se defender disso assumindo a pose de dama virtuosa a espera de um príncipe marido de rígidos de princípios (possivelmente um machista e moralista) Ou mesmo o contrário, vestir a persona da putona e afirmar esse lugar como empoderamento sexual feminino. Ambas atitudes reativas e pouco saudáveis. Mas eu não estou aqui para ditar cartilha comportamento feminino. Só quero afirmar que não devemos aderir a estáticos papeis pré-concebidos tipo "a dama" ou "a puta" para lidar com a canalhice dos homens. Cada mulher tem condição de saber a melhor forma de agir de acordo com a situação. E se ficar em dúvida deve procurar ajuda de outras mulheres, inclusive as amigas do canalha. Eu como amiga de vários canalhas posso tentar incutir alguma consciência em suas mentes. Canalhas do bem não são bons namorados ou maridos, mas podem ser excelentes amigos. E eu que sou amiga do cara posso e devo fortalecer as minas que ele fica na sororidade só por dar a minha opinião sincera quando ele me conta sobre sua relação. Eu digo para os meus amigos coisas como: você tem medo de se envolver por isso é sexualmente compulsivo e isso te faz menos potente etc e tal ou você magoa pessoas com seu comportamento. Quando eu não digo eu escrevo. Mas faço tudo no intuito de que mudem de atitude ou se assumam logo canalhas. Daí a moça bem informada vai ter a possibilidade de resolver se quer ou não entrar naquela ciranda. Eu acho muito importante ter esse papel com alguns pacientes na clínica e amigos na vida. E com esse texto e muitos outros que virão pela frente eu quero convocar cada mulher a falar mais sobre isso e até mesmo deixar constrangido um canalha, se necessário. Até porque, os homens legais existem e precisam ser distinguidos do capim da canalhice. E uma vez desmascarados e por vezes preteridos, esses adoráveis canalhas queridos vão aprender a escutar a gente, resolvendo o problema que eles dizem ser APENAS de comunicação."

Alice Souto - Psicóloga 

06 agosto 2016

"O que não dá mais para tolerar - e isso é muito positivo - são os feministos por conveniência. Ótimos em redigir belos discursos de adesão, postar listas de artistas mulheres ou comemorar enfaticamente a vitória das heroínas do esporte, mas sem por isso perder a chance de fazer um contra-ataque de desmoralização pública das feministas que detestam, ou atropelar tranquilamente a fala de suas colegas de trabalho, entre muitas outras coisinhas simpáticas. Nunca me colocaria no lugar de porta-voz das reflexões e demandas que o movimento negro e só ele pode realizar, mas é claro que devo refletir e poder discutir sobre racismo no Brasil, mas especialmente aquele racismo que se manifesta como uma espécie de cumplicidade tácita entre brancos em diversas situações. Desfazer esse pacto sinistro que nos une é fundamental e não passa tanto pela produção de textos ou exibição de consciência crítica, mas por gestos e posicionamentos em situações concretas. O feminismo pode (e deveria) atuar no campo dos discursos como uma perspectiva drasticamente crítica que depende fortemente da dimensão autocrítica. Mas não há fórmulas para esse exercício e acreditar que há é já entrar perigosamente no campo da ilusão de controle da linguagem, inclusive da própria." - 

Laura Erber 

02 agosto 2016

"Darcy Ribeiro tem um dito bonito, que volta e meia aparece citado por aí. É: "Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu". Mas ele era o Darcy Ribeiro, né, seu fracasso é o de quem caiu atirando.
Hoje em dia, quando o citam, a coisa é completamente diferente. É o cultivo de um derrotismo triunfante, a paixão impotente das vitórias morais, a redenção da lacração, a defesa triste do deserto por uma retórica puída que não inventa coisa alguma, mas que pelo menos conserva a integridade de sua própria iluminação. Nossa grande tarefa é a de distribuir tabus, assuntos que não podem ser tocados, universidade pública não gera desigualdade, não existe professor não ideológico, o petróleo é nosso, crise fiscal é o que o Coiso cria para botar mais no do pobre. O serem, esses assuntos, tocados vira sinal dos tempos, estamos nós, pobres de nós, à mercê de um mundo todo mal intencionado. Porra, saibamos enfrentar essa merda pra parar com essa ladainha denuncista e lamuriosa de olha como a mídia é malvada, olha como o PMDB é ardiloso, olha como o verdamarelo é burro, olha como...
O grande trunfo da esquerda hoje em dia é o de não se misturar com a gentalha (a menos que a gentalha seja o baixo clero antes do golpe, aí é questão de governabilidade); é criar de antemão os vencedores bárbaros, e fazê-los, é claro, vencer para detestarmos estar em seu lugar. Gozamos em praça pública nossa própria derrota." 
Felipe Vicari de Carli