"Darcy Ribeiro tem um dito bonito, que volta e meia aparece citado por aí. É: "Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu". Mas ele era o Darcy Ribeiro, né, seu fracasso é o de quem caiu atirando.
Hoje em dia, quando o citam, a coisa é completamente diferente. É o cultivo de um derrotismo triunfante, a paixão impotente das vitórias morais, a redenção da lacração, a defesa triste do deserto por uma retórica puída que não inventa coisa alguma, mas que pelo menos conserva a integridade de sua própria iluminação. Nossa grande tarefa é a de distribuir tabus, assuntos que não podem ser tocados, universidade pública não gera desigualdade, não existe professor não ideológico, o petróleo é nosso, crise fiscal é o que o Coiso cria para botar mais no do pobre. O serem, esses assuntos, tocados vira sinal dos tempos, estamos nós, pobres de nós, à mercê de um mundo todo mal intencionado. Porra, saibamos enfrentar essa merda pra parar com essa ladainha denuncista e lamuriosa de olha como a mídia é malvada, olha como o PMDB é ardiloso, olha como o verdamarelo é burro, olha como...
O grande trunfo da esquerda hoje em dia é o de não se misturar com a gentalha (a menos que a gentalha seja o baixo clero antes do golpe, aí é questão de governabilidade); é criar de antemão os vencedores bárbaros, e fazê-los, é claro, vencer para detestarmos estar em seu lugar. Gozamos em praça pública nossa própria derrota."