"Lucy" é a versão do Luc Besson para "Ela" do Spike Jonze. Ambos têm Scarlett Johansson como protagonista, desenvolvendo a mesma trajetória, a ampliação da capacidade cognitiva até o ponto de torná-la incomunicável para o humano. No filme de Beson, isso se traduz em porradaria e solidão para Lucy, no de Jonze, em falta de intermédio entre a voz de Samanta, o programa de computador com emoções e inteligência humana , e o seu usuário, Theodore. Lucy tem um corpo se desfazendo, a Samanta de Jonze não tem corpo, por essa via ambas elevam o humano ao divino. Porém, se no caso de Jonze é o amor que deixa a relação entre o humano e o divino com algum par de igualdade, para Besson é a violência a responsável por isso. Talvez ambos traduzam a nossa concepção de Deus, de um lado um ser que nos ama, mesmo estando além de nossas limitações temporais e cognitivas, de outro um ser cuja violência supra humana nos castiga sem piedade e é por nós perseguida, como se fôssemos ao mesmo tempo seu algoz e sua vítima. Talvez Lucy e Samanta nos digam mais de nós do que de Deus, pois o que elas revelam é o modo como nós compreendemos o divino : uma elevação daquilo que julgamos limitado em nós e ilimitado em Deus, amor e violência."
"De Kant, de Hegel, de Euclides, de Bopp e da Amazônia
Trecho de um artigo que escrevi ( com ajuda de ideias produzidas em sala de aula e dos encontros do grupo de estudos)
Dessa maneira, se em Kant a forma política da sociedade é a expressão de um plano oculto da natureza que a razão realiza, em Hegel o Estado é o Espírito Vivo que se auto reconhece como forma política. O que significa dizer que em ambos a natureza produz o seu Outro( sociedade), que, paradoxalmente, está contido nela na medida em que dela se afasta.
A formação torna-se, portanto, aquilo que está aquém e além do mundo político, da mesma forma que está antes e depois da natureza. Antes porque os sujeitos em formação no universo da política realizam uma prescrição natural e depois porque a realização de tal desígnio os emancipa da natureza. Eis o paradoxo
Devemos destacar, neste ponto da argumentação, algo imprescindível para leitura posterior de Euclides da Cunha e de Raul Bopp : nos sistemas filosóficos de Kant e Hegel o homem (europeu) é formulado como um ser dotado de capacidade “natural” para superar a natureza, o que acarreta pensar, que o plano da natureza seria realizar as formas políticas vigentes ou em processo de formação na Europa. Assim, para tais filosofias, os homens do esclarecimento estão naturalmente inclinados para realizar a razão nos moldes das formas políticas europeias. É dentro desse quadro que acontece aquilo que poderíamos chamar de sequestro temporal da natureza, ou melhor, naturalização do tempo como realização do Estado.
Nele, a história e a natureza acabam se tornando reféns de um círculo vicioso em que o percurso político dos modernos estados europeus se torna o crivo de apreciação de ambas. Segundo tal perspectiva, para fora desse percurso não poderia existir nem história, nem natureza. Daí que quando Euclides define a Amazônia como “terra sem História” e Bopp “como terras do sem fim” o emperramento desse círculo vicioso acaba sendo produzido.
Pensando com e contra Euclides, sem História pode significar sem natureza, portanto, sem substância, lugar onde o círculo vicioso não se aplica, ou seja, lugar onde a natureza não faz Estado. Isso nos leva a pensar que terras do sem fim pode ser entendido como lugar em que o tempo e o espaço confundem-se de tal maneira que o primeiro passa a não medir o percurso necessário de quem quer seja ( Estado ou Sujeito) pelo segundo. Uma terra sem fim é também sem formação, livre do formato histórico da natureza segundo os interesses europeus."
"Miguel Falabella formou-se em letras pela universidade federal do rio de janeiro. Deve ter estudado teoria da literatura e estar a par da teoria da mimesis aristotélica. Diz o Aristóteles na Física que a arte " imita a natureza", precisando um pouco depois que " por um lado, a arte termina o que a natureza foi incapaz de realizar, por outro ela a imita". Na poética, ele ainda complementa dizendo que a tragédia imita atos e não caracteres, ou seja , ações e não substâncias. Não sei se um filósofo grego pode ser chamado a esse certame, mas sei que uma conclusão simples para Miguel tirar lá do seus livros empoeirados de teoria é que , segundo Aristóteles, a arte imita a natureza em sua capacidade produtiva e não na reprodutiva, o que significa dizer que a arte é antes de tudo produção e não reprodução da forma política da comunidade. Sendo assim, reproduzir todos os entendimentos racistas a respeito do corpo negro tido como "naturais" pela sociedade brasileira não é tornar a sexualidade dos negros merecedora de reconhecimento público , muito pelo contrário, é apenas reforçar a "natureza" do racismo brasileiro, a tão propalada "natureza sexual" do negro e principalmente das negras. Uma arte que apenas devolve aos negros o lugar que eles já têm em nada está contribuindo para ação afirmativa da vivência de negros e negras, inclusive de suas sexualidades. O que "arte" de Miguel é incapaz de fazer, por todos os motivos imagináveis, é produzir algo que a natureza racista da teledramaturgia brasileira não é capaz de realizar, a saber, negros que não precisem da autorização dos brancos para exercerem a sua sexualidade ou qualquer outro aspecto de suas vivências. A "arte" de "Falabella " é apenas mais uma reprodução de uma sociedade com grande experiência em produzir racismo."
"Você votaria em um candidato que acha que é oposição de si mesmo, ou em outro que acha que é governo contra quem o colocou no poder. Se o atual cenário politico no amazonas for legalizado, isso será normal."
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