14 dezembro 2016

"A cada revelação do modus operandi da nossa república o que fica mais e mais claro é que a democracia não pode ser nunca um regime, um sistema de regras e procedimentos. A democracia enquanto vetor de mobilização da sociedade diante daquilo que ela é e que pretende ser só existe quando o regime, no qual uma única empreiteira paga 7 milhões de reais por lei, é questionado diretamente pelo povo em movimento. Existe apenas o movimento de democratização ou de fechamento autoritário. Essa é a verdade comum que as lutas ensinam, a constatação de que o direito só funciona como jurisprudência, nunca como norma. Quando cerramos fileiras em torno de abstrações como a "lei", o "estado de direito", a "democracia" ou mesmo a "esquerda", estamos derrotados de antemão, porque nada disso existe, são conceitos vazios sem que o concreto das lutas os faça funcionar. E numa sociedade neoescravagista como o Brasil, na qual há centenas de milhares de presos sem julgamento e a violência assassina da polícia militar é o modo naturalizado de regulação da pobreza, defender essas abstrações, além de equivocado, soa como verdadeiro escárnio, ainda que involuntário. Democratizar a república depende da construção de novas relações de força, sem as quais o comando capitalista fica nu. Essa é a nossa atual situação; o comando está completamente exposto e funcionando de modo completamente arbitrário."

Silvio Pedrosa