23 agosto 2014

"Mas uma coisa é designar a máquina totalitária, outra coisa é lhe atribuir tão rapidamente uma vitória definitiva e sem partilha. Assujeitou-se o mundo, assim, totalmente como o sonharam - o projetam, o programam e querem no-lo impor - nossos atuais 'conselheiros pérfidos'? Postulá-lo é, justamente, dar crédito ao que sua máquina quer nos fazer crer. É ver somente a noite escura ou a ofuscante luz dos protetores. É agir como vencidos: é estarmos convencidos de que a máquina cumpre seu trabalho sem resto nem resistência. É não ver mais nada. É, portanto, não ver o espaço - seja ele intersticial, intermitente, nômade, situado no improvável - das aberturas, dos possíveis, dos lampejos, dos apesar de tudo.
A questão é crucial, sem dúvida inextricável. Não haverá, portanto, resposta dogmática para essa questão, quero dizer: nenhuma resposta geral, radical, toda. Haverá apenas sinais, singularidades, pedaços, brilhos passageiros, ainda que fracamente luminosos. Vaga-lumes, para dizê-los da presente maneira. Mas no que se tornaram hoje os sinais luminosos evocados por Pasolini, em 1941, e, em seguida, tristemente revogados em 1975? Quais são as chances de aparição ou zonas de apagamento, as potências ou as fragilidades? A que parte da realidade - o contrário de um todo - a imagem dos vaga-lumes pode hoje se dirigir?"
Georges Didi-Huberman, A sobrevivência dos vaga-lumes, 2011 [2009], pp. 42-43.

via: Silvio Pedrosa - Facebook