07 dezembro 2016

"Me parece que se partimos da pergunta "o Estado de Direito existe ou não existe?" é inevitável cair em idealizações que terminam pressupondo uma continuidade ilusória entre a dogmática e o real e que acabam servindo, por exemplo, para sustentar esse discurso do golpe, que pressupõe que antes de 12 de maio o Brasil tinha um estado de direito funcionando. 

É muito mais produtivo, me parece, pensar "estado de direito" como uma categoria, uma ficção, uma construção-zinha teórica, que enquanto tal, na realidade, sempre esteve mesclada com as piores manifestações do chamado estado de exceção. Aliás, se você for cavoucar mesmo, verá que a própria invenção desse conceito de estado de direito é parte de uma operação bastante brutal, eivada e atravessada por procedimentos de exceção -- embora seu funcionamento teórico necessite da ficção, da ilusão, de que estado de exceção e estado de direito sejam coisas separadas e antagônicas. 

Em outras palavras, Christiane, não se trata apenas de entender que a porrada vem antes do Direito. Trata-se de entender também que o Direito é 1) moralmente indistinto daquela porrada; 2) construído sobre a ilusão de que ele é um antídoto àquela porrada."

Idelber Avelar