21 outubro 2016

"É muito importante perdoar e ser perdoado. Demorei pra entender o quanto isso tem nada a ver com o exercício de perdão que algum cristianismo me ensinou. O perdão é da natureza, então eu poderia entender o perdão dentro dos meus Deuses, que são natureza. O fenômeno de perdoar e ser perdoado é a própria vida seguindo o seu fluxo, como uma estação do ano se deixando substituir pouco a pouco por outra diante dos nossos olhos; como a certeza inquestionável de que os vendavais passam; como o degelo, o girino, o casulo, o amanhecer. Perdão é uma necessidade. Você não vai longe se não se liberta e não liberta o outro. Tem que desamarrar. Vai contra a natureza de todas as coisas não perdoar, vai contra a seiva que está em tudo e tem secura por caminho, por aventura, por transformações. Quem não desfaz mágoa está se implodindo. Parando, inventando um colapso, abandonando-se, intoxicando sua seiva, traindo sua natureza, desmatando seu ecossistema. Se tem uma coisa que o fenômeno da morte - que é quando a totalidade da vida pode ser finalmente percebida como tão passageira e frágil quanto qualquer fragmento dela - faz, com seu rodopio sobre nós, é ensinar sobre a vida. A ameaça da Morte é reveladora das muitas medicinas que desprezamos. Uma delas, uma das mais importantes, aquela que versa sobre a pequenez de tudo diante da Morte, para que nos curemos a tempo, a tempo de melhor viver, é a medicina do Perdão."

Maria Gabriela Saldanha