23 agosto 2014

"Voltando à conversa sobre independência do Banco Central, fala-se muito, mas há uma clara falta de conhecimento sobre o tema. Primeiro, que muitos políticos e jornalistas têm falado sobre a "autonomia" ou "autonomia formal" do órgão, o que é um equívoco: o Banco Central é autarquia, logo, *ele já é autônomo por lei*, o que é diferente de "independência". É possível alargar a sua autonomia como, p.ex., o que acontece com as outras autarquias especial que nós chamamos de "agências reguladoras", mas é preciso lembrar que até elas funcionam sob o controle de algum ministério. O que seria essa "independência" então? Poderia, p.ex., ser privatização ou uma privatização branca. Quando os primeiros bancos centrais surgiram, na esteira do crescimento do capitalismo, respectivamente na Inglaterra (1694) e França (1716) eram organizações privadas que, no entanto, foram estatizadas ao longo do tempo -- no Reino Unido isso foi no imediato pós-guerra, na França, um pouco antes, muito embora Napoleão já tenha criado uma estrutura relativamente pública em 1800. Curiosamente, o avanço do neoliberalismo determinou a mudança dessa tendência: em 1993, a França viu seu Banco Central ganhar independência no processo de adequação ao sistema financeiro europeu, no caminho da construção do Euro, e o Reino Unido viu o mesmo acontecer não pelas mãos de Thatcher, mas sim de Blair em 1997 (no seu primeiro mês de governo!). Parece um debate bobo, ou implicância com x ou y, mas não. É um debate sério. Um Banco Central é o coração de um sistema financeiro. As tarefas que ele executa na emissão ou recolhimento de dinheiro, emissão de títulos públicos e quetais são de importância vital. Se um Banco Central estar nas mãos de uma burocracia é um problema, por outro lado, a simples passagem disso para as mãos de uma tecnocracia privada, a serviço do oligopólio financeiro nacional, não é solução, muito pelo contrário. Uma análise mais atenta do que aconteceu na Europa poderia, quem sabe, fazer essa proposta ser vista com mais ceticismo, mas não: isso está sendo vendido como a coisa mais inovadora possível. Estou longe, mas bem longe mesmo, de ser estatista, mas só não me venham sugerir deixar os ratos cuidando do queijo."

Hugo Albuquerque - facebook