10 julho 2016

"O governo liberal não é aquele que se exerce de modo direto sobre o corpo de seus sujeitos ou que espera deles uma obediência filial. É um poder totalmente em contração, que prefere ordenar o espaço e reinar sobre interesses, mais do que sobre corpos. Um poder que vela, vigia e age de forma mínima, intervindo apenas onde o quadro é ameaçado, sobre aquilo que vai demasiado longe. Só se governam sujeitos livres, e tomados em massa. A liberdade individual não é algo que possamos acenar contra o governo, visto que ela constitui, de fato, o mecanismo sobre o qual ele se apoia, aquele que ele regula o mais delicadamente possível com o intuito de obter, na agregação de todas essas liberdades, o efeito de massa esperado. 'Ordo ab chao'. O governo é esta ordem à qual obedecemos “como comemos quando temos fome, como nos cobrimos quando temos frio”, esta servidão que eu coproduzo no próprio momento em que procuro minha felicidade, em que exerço minha “liberdade de expressão”. “A liberdade do mercado necessita de uma política ativa e extremamente vigilante”, especificava um dos fundadores do neoliberalismo. Para o indivíduo, não há liberdade a não ser vigiada. É o que os libertarianos, em seu infantilismo, jamais compreenderão, e é esta incompreensão que gera atração pela idiotice libertariana em determinados hackers. De um ser autenticamente livre, nem sequer se diz que é livre. Ele apenas é, existe, move-se conforme seu ser. Só se diz de um animal que ele está em liberdade quando cresce num meio já de todo controlado, esquadrinhado, civilizado: no parque das regras humanas onde se dá o safari. “Friend” e “free” em inglês, “Freund” e “frei” em alemão, provêm da mesma raiz indo-europeia que remete à ideia de um potência comum que cresce. Ser livre e estar ligado, são uma e a mesma coisa. Eu sou livre porque estou ligado, porque faço parte de uma realidade mais vasta do que eu. Na Roma Antiga, os filhos dos cidadãos eram os 'liberi': por meio deles, era Roma que crescia. E isso significa dizer que a liberdade individual do “eu faço o que eu quero” é uma piadinha e um embuste."

Aos nossos amigos