15 julho 2014

O fundamento político da instauração do estado de exceção é sempre uma 'necessidade' (e parte do princípio expresso no adágio latino 'necessitas non habet legem' - 'a necessidade não tem lei'). O quê escapa a esse raciocínio, formalmente correto, entretanto, é o fato de que a normalidade estatal tal como a conhecemos é ela mesmo o produto de uma sequência de 'necessidades' e que, portanto, falar em estado de exceção é sempre denunciar a natureza mesma do estado enquanto máquina de repressão, disciplinarização e controle, ou seja, a normalidade estatal é ser um poder discricionário, arbitrário, cujo refreamento depende da capacidade da relação de força que conseguimos estabelecer dentro e contra ele. Na atual conjuntura, todas as máquinas de produção de consenso, de subjetivação (particularmente o oligopólio midiático), atuam para produzir a necessidade de suspender os direitos daqueles que ousam tensionar a relação de comando, constituindo uma subjetividade subversiva dessa ordem e afirmando uma prática antagonista. A retirada da pauta da democratização da mídia do programa de Dilma Rousseff (PT) não é fortuita (se bem que nenhuma medida concreta fosse encaminhada nesse sentido, a existência da proposta enquanto bandeira programática tensionava a relação entre o governo e o oligopólio midiático). É o tributo pago pela cooperação que sustenta o consenso da exceção (o editorial de O Globo que descreve os manifestantes como 'inimigos da democracia', por exemplo) e a garantia de que essas máquinas de subjetivação continuarão operando para produzir 'necessidades' ou, como se costumava escrever no século XVII, não à toa o momento de nascimento do estado, 'razões de estado'.

Silvio Pedrosa - Facebook