29 julho 2014

Adriano Pilatti - Puc Rio de Janeiro

"CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, artigo 5º: II- ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; IV- é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; IX- é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; XXXIX- não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; LIV- ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV- aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; LVI- são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos; LVII- ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; LXVIII- conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.
Confesso: concordo integralmente com os perigosos enunciados acima.
Confesso mais: ajudei, muito modestamente, a elaborar o documento subversivo que os consagra, como assessor da organização “Assembleia Nacional Constituinte”, presidida pelo notório subversivo Ulysses Guimarães.
Confesso mais ainda: defenderei enquanto viver as verdades inscritas nesses enunciados.


Confesso: sou advogado inscrito na organização "OAB-RJ".
Confesso mais: apoio e admiro a atuação em prol das liberdades democráticas que a atual gestão e a anterior têm realizado.
Confesso mais ainda: acabo de ingressar na organização "Instituto dos Advogados Brasileiros", apoio e admiro o trabalho em prol da cultura jurídica democrática, e do esclarecimento geral, realizado pela atual gestão e pela anterior.


Confesso: minha profissão é a de professor, e minha vocação, a de educador.
Confesso mais: trabalho há 27 anos na organização "Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro", onde por cinco anos chefiei sua assessoria jurídica, por seis anos dirigi seu Departamento de Direito, e há onze anos ininterruptos sou representante docente no seu Conselho Universitário.
Confesso mais ainda: ao longo destes 27 anos, tenho criado, coordenado e participado de projetos de extensão universitária que visam à promoção da cidadania e à garantia de direitos dos desvalidos e vulneráveis.


Confesso: tenho livros em minha casa.
Confesso mais: muitos deles foram escritos por, ou sobre, suspeitos de reacionarismo, conservadorismo, liberalismo, republicanismo, “social-democratismo”, socialismo, anarquismo ou comunismo, além dos que, anteriores a essas classificações, foram notórios subversivos, como Jó, Salomão, Sófocles, Heráclito, Sócrates, Lucrécio, Cícero, Jesus, Francisco de Assis, Maquiavel, Montaigne, Giordano Bruno, Spinoza e Shakespeare.
Confesso mais ainda: muitos deles têm capa de cor vermelha ou preta, ou, o que é mais grave, vermelha E preta.


Confesso: gosto de conversar com jovens, sobretudo com os que sonham com, e lutam por, um mundo melhor e uma vida menos ordinária para todos.
Confesso mais: gosto de escutar o que esses jovens dizem.
Confesso mais ainda: não me furto a ouvir nem a dialogar até mesmo com os mais irascíveis e radicais, porque desconfio que, no fundo de seus corações e mentes, há um enorme desejo de ternura, delicadeza, fraternidade, tolerância e paz, que pode ser resgatado.


Confesso: amo a liberdade, a bondade, a justiça e a beleza.
Confesso mais: desejo uma vida livre, boa, justa e bela para todos.
Confesso mais ainda: faço o que está ao meu alcance pra tentar realizar este desejo, mesmo sabendo que não conseguirei.


Confesso: luto pelas liberdades democráticas desde os 15 anos de idade quando, em dezembro de 1976, no restaurante Camafeu de Oxóssi, Mercado Modelo, Salvador, Bahia, ouvi o perigoso comunista Jorge Amado ler o Manifesto dos Artistas e Intelectuais Contra a Censura, e assinei.
Confesso mais: intensifiquei minha participação nesta luta a partir de junho do ano passado.
Confesso mais ainda: não pretendo parar.


Confesso: não me espanto com a baixeza, a covardia, a truculência, a ignorância e a incompreensão de parte de agentes repressivos do Estado porque, desde os 12 anos de idade, quando vi a tirania Médici se voltar contra meu Pai (um empresário liberal, íntegro e com enorme sensibilidade social), aprendi que esses vícios são constitutivos da maioria desses agentes em qualquer regime.
Confesso mais: penso o mesmo em relação aos potentados que controlam a impren$a em geral e a “brasileira” em particular.
Confesso mais ainda: pouco me importa o que esses tipos boçais pensem ou digam de mim, pois sei que, onde quer que se estejam, meu Pai, minha Mãe, minha Nonna antifascista – e outros grandes mestres com que a vida me presenteou – aprovam minha conduta e se contentam por eu ter aprendido o que me ensinaram, e isto me basta.


Confesso: me orgulho de cultivar a visão de mundo acima espelhada, e de perseverar, impenitente, em agir de conformidade com ela.
Confesso mais: procuro transmitir o gosto por estes amores a quem quer que me ouça falar e me veja agir.
Confesso mais ainda: onde quer que eu venha a estar, enquanto puder ouvir e falar, não vou parar.


Por tudo isto, aviso a quem interessar possa: não se deixem enganar - se, nos próximos dias ou semanas, algo de ruim vier a acontecer com a minha liberdade, a minha honra e/ou a minha imagem, será exclusiva e unicamente por conta dos “ilícitos” acima “confessados”. E o mesmo se aplica a quem pensa e age de formas semelhantes à minha. Tudo o mais será mentira, calúnia, vileza.
Peço por antecipação sinceras desculpas a quem vier a se entristecer se isso eventualmente acontecer, mas simplesmente não consigo viver, nem sentir, nem pensar, nem agir de forma diferente. A luta continua e, como dizem na imensidão das planuras de meu amado Sul natal, “não tá morto quem peleia”.
Às viúvas de Médici digo apenas: mais cedo ou mais tarde, uma risada os derrotará: a nossa. Aos que forem solidários, peço que compartilhem se puderem. E, com todos os doces e bárbaros desobedientes de qualquer tempo e lugar, repito: a vida é sempre primeira, a liberdade é o bem maior, a alegria é a prova dos nove. Sigamos! Obá, Ogunhê, Oraieiê, Caô Cabecilê, Iaroiê, Axé! "